5.16.2014

Zombies - Capítulo 5

- Pesadelos

Acordei com uma dor de cabeça anormal. Percebi, com um susto, que estava em uma maca. Havia apenas um fino lençol me cobrindo. Estava em uma sala branca, com o símbolo da D.C., que era apenas um círculo em chamas... chamas verdes.
Me sentei, meus músculos e membros estavam um pouco dormentes, minha visão ficava embaçada e a dor de cabeça me fazia querer sair berrando. Tentei me levantar mas, com um suspiro triste, percebi que não podia; uma corrente estava presa no meu pulso esquerdo.
Fiz uma careta e puxei o meu pulso, mas como já de se esperar, a corrente não se rompeu.
Eu tinha que saber do por quê de estar aqui, como eles descobriram que estávamos em Donksville, o que querem conosco e como estavam o resto do meu grupo.
Eu sou uma decepção. Isso mesmo: uma decepção. Meu pai me colocou como capitã deste grupo de resgate e eu falhei. Allie morreu, ela não pôde cumprir a sua promessa. Metade dos sobreviventes desapareceram e, provavelmente, estão mortos. E, por fim, e a pior parte de todas (não que as outras não sejam), acabamos capturados pela D.C.
Caí da maca, a corrente fez cortes e meu pulso começou a sangrar, ignorei. Cerrei o meu punho direito e soquei fortemente o chão. Meus olhos ardiam e eu gritava, não podia mais aguentar. Continuei socando o chão, minha pele descascava, minhas juntas estavam doloridas e duras, a cada soco a corrente puxava mais e mais. Meu pulso esquerdo sangrava muito e eu sentia uma dor descomunal. Mas, por incrível que pareça, eu não sentia tanta dor fisicamente quanto sentia espiritualmente e mentalmente. Eu queria gritar palavras que fariam um ser sã consciência tapar a minha boca e depois lava-la. Francamente, eu sou uma decepção. A maior de todas, se duvidar.
Parei de socar o chão e de puxar o pulso esquerdo quando ouvi o som de trancas sendo abertas.
Olhei para a porta, as lágrimas ainda desciam e eu estava quente de raiva.
A porta foi aberta com um ruído irritante. Uma mulher muito bem vestida e com um semblante irônico entrou na sala. Minha primeira reação foi me levantar e tentar ataca-la. Para o meu azar e sorte, a maca estava presa no chão e a corrente era resistente. Azar pois eu não pude pegar aquela mulher e estraçalha-la tamanha a raiva que eu estava. E sorte pois dois homens estraram armados e miraram suas armas em mim. Parei na hora e caí no chão. A corrente soltou um estalo e eu urrei de dor. Voltei para perto da maca e tentei não me mover mais.

– Parece que está perdendo o bom senso. – a mulher se aproximou e ficou à uma distância segura. Ajoelhou-se e olhou para o chão, onde a marca dos meus dedos ensanguentados jaziam. – Isso é o que acontece com a maioria das pessoas que ficam presas nessas salas. – abriu as mãos e sorriu, vitoriosa. – É por isso que as pessoas temem diante a Dead Corporation!
– E é isso que você quer? – perguntei, olhando-a de cima a baixo. A mulher tinha longos cabelos castanhos e olhos pretos. Usava uma calça de couro preta, uma blusa de veludo verde musgo, um casaco fino de seda vermelha e um salto médio preto. – Quer ser temida por todos?
Ela riu e respondeu, como se fosse a coisa mais óbvia de todas:
– Sabe, vou te contar uma coisa. Mas isso, é claro, se você não tentar me matar. – a olhei novamente e ela suspirou, entediada. – Vamos lá, vamos lá.
– O que aconteceu com os meu amigos e os sobreviventes? – perguntei, direta.
– Ah, eles? – ela fez um gesto que indicava desdém – Eles estão presos, mas não se preocupe. Todos estão vivos. – suspirei aliviada – Agora – ela se levantou –, quando você se acalmar, estarei aqui de volta, até lá, tente não se soltar mais dessa corrente. Está sujando tudo de sangue.

E então, graciosa como entrou, a mulher saiu da sala e pude ouvir a porta sendo novamente trancada. Suspirei, quando isso iria acabar?
Levantei-me, meu pulso voltou a latejar, talvez devesse fazer o que ela havia me dito. Não que eu me importasse se ela a sala estava suja ou não do meu sangue, mas sim porque o meu pulso doía e eu não estava afim de torce-lo por força-lo à toa.
Voltei a me deitar na maca e suspirei. Eu tinha que me acalmar e tinha que pensar em um método de sair dali. Se eu tivesse ao menos alguma dica...



– Acorde. – um mão bateu levemente na minha bochecha. Franzi o cenho e murmurei algo incompreensível. – Vamos, acorde logo.

Fiz uma careta e abri os meus olhos levemente. Minha visão ficou embaçada por alguns segundos e depois entrou em foco, me peguei encarando um par de olhos negros como ébano.
A mulher se afastou e sorriu.

– Finalmente. Pensei que tivesse morrido. – me senti na maca e percebi, com muito alegria, que meu pulso não estava mais preso na corrente, o peguei e massageei, ainda saía um pouco de sangue, mas a dor era suportável. – Se acalmou?
Não respondi a sua pergunta, mas perguntei:
– Quanto tempo eu dormi?
– Se acalmou? – ela perguntou novamente, seu sorriso havia sumido. A encarei, sem nenhuma expressão, apenas balancei a cabeça positivamente. – Que bom. – ela veio na minha direção, me encolhi, mas ela não encostou em mim, em vez disso, apenas se sentou na ponta da maca – Vou te contar o porquê de eu querer ser temida do que “amada”. Sabe, Catarina...
– Como sabe o meu nome? – a interrompi bruscamente, ela me mandou um olhar macabro.
– Não me interrompa, garota! – parece que sua paciência estava se esgotando. – Bom, aonde eu parei? Ah, sim. Sabe, antes de tudo isso começar, antes de terem descoberto o T-Vírus, isso mesmo, descoberto, os cientistas nunca criaram e nunca criariam algo como o Tyrant Vírus, é algo complexo demais. A sociedade nunca viveu em paz. Mesmo depois dessas malditas guerras, nós nunca entramos em paz completamente.
“Um dia, eu acho que eu tinha apenas uns doze anos de idade, eu sei, bem nova e há muito tempo, eu gostava de ver e pesquisar coisas novas, descobrir e aprender coisas novas, principalmente científicas. Eu já cheguei a achar que a ciência nos salvaria, eu estava errada, muito errada. Um dia eu vi num site o que muito cientistas achavam que seria o fim do mundo. Tinham opiniões muito diferentes e isso me irritava, por que não chegavam a um censo comum?”
“Eu era medrosa naquela época e quando li aquilo, quase morri, literalmente. Na minha opinião, as piores suposições de como o mundo iria acabar eram: por meio de um asteroide que atingiria a terra, extinção em massa, guerras descontroladas, camada de ozônio e... e vírus. Não digo piores por serem ideias tão absurdas a ponto de nunca acontecerem, não, digo as piores ideias pois eram as mais assustadoras.”
“Eu achava que o mundo acabaria em guerras, os humanos já estavam acostumados com aquilo. Mas quando eu vi o primeiro morto-vivo na minha frente foi devastador, foi brutal. Pela primeira vez, eu fui uma pessoa boa o suficiente para querer que os meus familiares morressem e nunca me vissem morrer, mas não foi bem assim.  Eu  tive que mata-los, Catarina. eu apenas matei o que já estava morto, não sinto remorso por isso.”
“Naqueles tempos apenas uma pequena vila no Ártico havia sido atingida pela epidemia, era como chamavam os cientistas após descobrirem sobre o caso. Eu morava nessa vila, Catarina. sabe o quão difícil foi sobreviver? Ver os seus familiares morrerem na sua frente e você ali, parada, sem poder fazer nada. Era algo deprimente, mas feliz. Isso é estranho, eu acho que sou a única pessoa que sente o prazer em matar. Eu não acho isso bom, não, pelo contrário. Mas eu não consigo parar isso, sabe? É a lei da vida, já ouviu falar? O mais forte sobrevive, o mais fraco morre. Mas o problema é que dali para frente não teria mais o forte e fraco, teria o esperto e o morto.”
“Nessa época você mal era nascida, Catarina. Depois de anos é que o mal se alastrou pelo mundo, foi nessa que época que sua mãe morreu. Que a minha irmã morreu, Catarina. Você entende isso, não entende? Você não deve estar entendendo. Deve estar se perguntando: ué, aquela mulher não estava explicando que era melhor ser temida do que amada? Por que ela está falando a história da vida dela? Lhe respondo, é bem simples. A partir do momento em que matei o meu pai, que foi, infelizmente, o primeiro errante, eu decidi que tinha que lutar para mim e apenas por isso.”
“A diferença entre ser temida e ser amada também é algo fácil de se responder. Quando você é amada, você é bajulada, fazem o possível e o impossível para te satisfazerem, é o caso de famosos e aqueles astros de Rock. Isso me irrita profundamente. Mas quando se é temida, ah, você pode sentir o gosto da vitória. Quando você é temida, não tem que se submeter a ninguém e todos morrem de medo de ti, fazendo o que você quer. Existe também uma diferença clara entre bajular e obedecer. Bajular é algo que você faz por livre e espontânea vontade, mas não recebe nada em troca, nem a mínima consideração. Mas quando é uma ordem, você submete outras pessoas a sua vontade, e o que elas ganham? A vida. É isso que acontece aqui, Catarina. aqui é como um formigueiro. Eu sou a rainha e esses homens são apenas os meus operários, eu mando e desmando. Isso é ser temida.”

Ela termina de contar, mas eu ainda estou perplexa demais para perguntar ou falar, então apenas a olho com incredulidade total.

– V-Você está mentindo! – falo, a voz falhando.
– Sobre ser temida? Não, acho que isso já ficou bem claro.
– Não é isso! Não se faça de sonsa! Você... você não é irmã da minha mãe, não pode! Ela nunca falou de você, é mentira!
– Mas é claro que ela nunca falou de mim, Catarina. – ela riu debochada – Ela mal sabia que tinha uma irmã.
– Não sabia? – perguntei, confusa.
– É claro que não, meu pai, seu avô, teve outro caso quando se separou de sua avó. Eu nasci desse caso.
– É... é coisa demais para a minha cabeça, pare!
– Você é quem sabe.
– Pare, pare! – comecei a gritar. Minha cabeça doía, minha visão escureceu e eu tombei na maca. Minha mente se apagou e eu caí no segundo pior mundo, vulgo, o mundo dos pesadelos.

Nã nã nã...
Eu ouvia essa música enquanto chorava, por que? Por que? Deixe-me explicar.
Era um dia comum, o céu estava claro, poucas nuvens se formavam, o sol estava ameno, não tão forte e não tão fraco. Uma brisa suave vagava pelo local, consigo levando um cheiro ruim, cheiro de sangue e algo podre. Eu estranhei.
Na hora eu estava no quintal da minha casa cuidando das flores e das plantas. Minha mãe estava ao meu lado, apreensiva e com uma expressão nada boa. Ela olhava ao redor de um modo calculista.
O incrível era que, mesmo o dia estando lindo, a nossa casa e o céu eram as únicas coisas que eu via. Uma neblina densa e mal cheirosa não me deixava olhar a vizinhança ou o centro comercial ali perto.

Mamãe, o que está acontecendo? perguntei, sem entender porque ela me puxou rapidamente para dentro de casa. Ela parou e me olhou, ela devia achar que eu era idiota ou era imatura, ainda a chamava de “mamãe”, apesar de ter 14 anos.
Catarina... posso te falar uma coisa?
Claro, mamãe.
Eu te amo, saiba disso. Suba e diga para o seu pai que aquilo aconteceu.
O que aconteceu? O que significa “aquilo”, mamãe? Me responda! eu já chorava naquela hora, ela apenas sorriu, o mesmo sorriso que dava quando eu estava com medo e me deu um beijo na testa.
Dias melhores virão...

– Dias melhores virão... – eu resmungava. Tomei um susto e me sentei com um sobressalto na maca. – Dias melhores virão... – repeti e suspirei. A maior parte dos meus pesadelos envolvia o dia em que minha mãe havia morrido e virado um daqueles errantes. Eu não aguentava mais isso. Se um dia eu encontrasse a minha mãe, eu pediria perdão. Por tudo.
– Essa frase é bonita, Catarina. – a voz daquela mulher irrompeu a sala. Virei assustada em direção ao som.
– Você fica me observando enquanto eu durmo? – perguntei, irritada.
– Não. Eu queria lhe dar uma notícia boa, apenas.
– Notícia boa? Ah, deixe-me adivinhar. Você vai me libertar. – falei debochadamente.
– Sim.
– O que?
– Eu vou te libertar. – ela bateu a mão na porta e um homem entrou com uma sacola. – Leve isso como um favor que estou fazendo para a sua mãe. Ela era minha irmã, afinal.
– Você não a conheceu!
Ela me olhou com raiva.
– Te darei cinco minutos. Não posso dar mais, tenho que buscar os seus... amigos – ela quase engasgou com a palavra “amigo”, como se fosse uma espinha presa em sua garganta e saiu da sala.

Abri a sacola, dentro havia o meu uniforme da Alfa e as armas que estavam comigo na hora em que fomos capturados. Minhas duas adagas, a pistola e as duas metralhadoras. E as munições.
Estranhei, mas vesti a roupa. E se fosse uma armadilha? Mas se fosse, por que eles me devolveriam ar armas? Isso não tinha importância agora, deveria terminar de me vestir.
Terminei de me vestir e prendi as armas em seus devidos lugares.
Ouvi duas batidas na porta e, em seguida, a mulher entrou.

– Não iria esperar mais, ainda bem que está pronta. Siga-me.

Apenas assenti e a segui para fora da sala. Ela estava sozinha, mas percebi que não estava desarmada e estava com uma roupa diferente agora.
Usava um short não tão curto preto, blusa de couro preta, com o símbolo do D.C. atrás e uma bota preta. Tinha duas pistolas presas na cintura, uma de cada lado, e uma katana nas costas. A katana era muito bonita, dava para perceber. O cabo era ornamentado em ouro e pedras, mas tinha couro também e parecia bem confortável de se segurar. A lamina brilhava e estava bem afiada.

– Está me encarando.
Olhei o seu rosto, mas nada disse e ela sorriu, se virou novamente para a frente e virou à esquerda.
– Chegamos.

Ela estava em frente à uma porta, essa era diferente, era de metal e poderia passar umas cinco pessoas alinhadas ao mesmo tempo.
Ela abriu a porta e um vento forte me atingiu, junto com ele veio a areia, o pó e alguns galhos e folhas.
Quando o vento cessou um pouco, tirei os meus braços que estavam em frente ao meu rosto em forma de proteção e olhei o lado de fora, sim, lado de fora.
Um helicóptero batia suas hélices agora vagarosamente. Sky, Ross e Daniel conversavam de um lado, todos com os uniformes da Alfa. Os sobreviventes, Kim, Jake, Justin, Megan, Phoebe e Claire de outro.

– Catarina... – Sky foi a primeira a me notar e sorriu, como se não me visse a séculos. Ela veio na minha direção e seu sorriso se alargou, eu estava sem reação. Ela jogou os braços ao meu redor e me abraçou fortemente, quase fiquei sem ar – Nunca mais nos preocupe.
– Sky... – sorri em mente e ela me soltou – Obrigada.

Ela apenas sorriu e eu olhei a mulher que, estranhamente, fitava o céu como se tivesse visto algo muito estranho, ela percebeu que eu a estava encarando, novamente, e me olhou. Seu semblante era sério.

– Vocês podem entrar no helicóptero. – eu já ia me virando, quando a mão dela me agarra pelo pulso direito e eu me viro – Espere um pouco.

Assinto com a cabeça e todos entram no helicóptero, que era preto e verde, com o símbolo da D.C. do lado.

– Quando você encontrar novamente ao seu pai, fale que me encontrou. – ela pegou a katana e me estendeu – Um presente meu para você. Aliás, meu nome é Annie. – ela sorriu e se virou, me deixando para trás e entrando novamente na sede da Dead.

Minha cabeça girou, mesmo que eu dissesse que nunca minha mãe havia falado dela, eu tinha me enganado. Eu e minha mãe sabíamos dela. Sabíamos que ela era a minha tia. Sabíamos do porquê de eu nunca tê-la visto. Sabíamos quem era  Annie Côrdeza. Minha mãe sabia que era a  Judith Côrdeza.  Eu sabia que era a  Catarina Côrdeza.
Eu iria encontrar essa mulher novamente, eu iria encontrar Annie novamente. Ela me devia muitas explicações. Pois agora eu sabia, bem nessa hora eu me toquei. Todas aquelas mortes, toda a minha culpa, aquilo não era de todo verdade, mas não chegava a ser uma mentira.
Annie parecia ser uma pessoa normal, uma sobrevivente em um mundo pós-apocalíptico, mas essa não era a verdade. Annie, minha tia, irmã da minha mãe, nunca foi e nunca será um pessoa normal.
Annie Côrdeza era um monstro. E dos piores tipos.

– Catarina! – ouvi a voz de Ross e Megan em coro me chamando. Me virei e dava uma risada, enquanto via Ross e Megan fazerem uma cara feia um para o outro.
– Estou indo! – falo e vou correndo, subindo no helicóptero e me sentando entre Jake e Phoebe. Jake parece não gostar pela cara que fez, mas como não tem como dizer não, por todos os outros lugares estarem ocupados, apenas aceita com uma careta. Phoebe, ao contrário, sorri e estende um cobertor à mim.
– A viagem vai ser longa. Pararemos duas vezes no caminho. – estendeu seu sorriso e me cobriu, como se fosse a minha mãe.
– Obrigada.
– Phoebe – Jake falou, fechando os olhos e cerrando os punhos –, não seja tão gentil, você mal a conhece.
– Eu fui gentil com você quando não te conhecia direito, Jake. – Phoebe ficou séria e lhe estendeu um cobertor, ele o aceitou, mesmo fazendo birra. – Agora, descansem. Mais tarde conversamos.

Suspirei, isso foi muito estranho. Me recostei no banco e me cobri direito. olhei o teto do helicóptero e cocei a cabeça. Minhas pálpebras pesaram e eu fechei os olhos.

Suspirei novamente e, em seguida, já havia caído em um sono profundo.

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